Lunda Tchokwe

Os Tchokwe / Chokwe desfrutam de uma admirável tradição de esculpir máscaras, esculturas e outras figuras. A sua arte inventiva e dinâmica, é representativa das várias facetas inerentes a sua vida comunitária, dos seus contos míticos e dos seus preceitos filosóficos. As suas peças de arte gozam de um papel predominante em rituais culturais, representando a vida e a morte, a passagem para a fase adulta, a celebração de uma colheita nova ou ainda o início da estação de caça. O nome Tshokwe apresenta algumas variantes (Tchokwe, Chokwe, Batshioko, Cokwe) e, entre os portugueses, ficaram conhecidos por Quiocos . "Nesta pagina podemos usar qualquer variante do nome Tshokwe (acima referido)"

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Tradutor/Translation

segunda-feira, 26 de setembro de 2011

LÍNGUA ‘’UTCHOKWE’’

ASPECTOS FUNDAMENTAIS E PARTICULARES DA LÍNGUA ‘’UTCHOKWE’’ (segundo J.V. Martins)

Fonética
Alfabeto e seus caracteres
De acordo com o quadro fonético dos caracteres, preconizado pelo Instituto de Cultura e Línguas Africanas, que adiante apresentamos, as vogais são como em português: a, e, i, o, u. São breves ou longas. A vogal e (breve) na pronúncia, rápida antes da vogal, geralmente soa como i. Exemplo:
Pembe atoma; penbiatoma (cabra branca).
Ngombe apema; ngombiapema (boi bom).
Regra geral não há ditongos: ai, ao, eu, ou.
Quando há duas vogais finais, formam duas sílabas, sendo a primeira sempre acentuada. Por isso, empregamos as semivogais w e y para acentuar a vogal seguinte, ou das sílabas anteriores ou seguintes. O w emprega-se em substituição do u: Exemplo:
Ku-fua; ku-fw-a (morrer).
O y substitui o i breve. Exemplo:
limbia; y-im-by-a (panela).

A grafia do r utchokwe é um assunto muito discutido e que ainda não está bem resolvido. Escreve-se r ou l, conforme o parecer de cada um. Em algumas regiões de Angola, onde há mistura de tutchokwe com luenas, ambundos, ganguelas, umbundos, luchazes e outros, substitui-se o r por l.

Quase todos os livros que temos visto escritos em língua Utchokwe, quer nas missões protestantes quer católicas, escrevem l em vez do r. Ora, se bem que os Tutchokwe não pronunciem o r forte, muito menos pronunciam o l, mas sim um r línguo-palatal tão fraco como aquele que nós pronunciamos na palavra ‘’arara’’. O facto de , nas publicações em Utchokwe, editadas pelos missionários protestantes e católicos, se escrever l em vez de r, dá-nos a entender que, nas regiões onde essas publicações foram feitas, os tutchokwe pronunciam mais acentuadamente o l. Os próprios nativos da região nordeste da Lunda dizem que, tal pronúncia é antiga e de mistura com a língua Umbunda, enquanto nesta região o r se deve à influência dos lundas e quimbundos.


Dum modo geral, dá-se preferência à ortografia sónica. Todavia, em casos consagrados pelo uso, empregámos as fórmulas vulgarmente conhecidas, com o propósito de obter uma melhor compreensão.
Como o nh português se prestava a confusões, pela decomposição de n e h aspirado, adoptámos o grupo ny.
No intuito de ser melhor compreendido e auxiliar o leitor, junta-se, a seguir, os quadros fonéticos dos grafemas preconizados pelo Instituto de Cultura e Línguas Africanas e dos que empregámos para escrever a língua dos Tutchokwe.
Quando há duas vogais iniciais, o i ou o e funcionam como semivogais. Por isso, o i é substituído e grafado com y.


Exemplo:
Iáia; yaya (irmão mais velho)
Áiáia; ayaya (irmãos mais velhos.
As consoantes são: b, c, d, f, g, h, j, k, l, m, n, p, q, r, s, t, v, x, z e soam também como em português, devendo observar-se todas as indicações adiante mencionadas.

Grafia e pronúncia
Em utchokwe, ou quioco, como esta língua é mais conhecida, de acordo com algumas normas estabelecidas para a escrita das línguas bantas, dá-se a cada letra um valor único em qualquer situação em que ela se encontra, isto é, a cada signo um som e a cada som um signo.
Assim, o s tem sempre o valor de ss e de c antes de e ou l.
O g nunca vale j. Pronuncia-se sempre ‘’guê’’.
O j pronuncia-se sempre como em português nas palavras ‘’José’’ e ‘’justo’’.
O o nunca é empregue com o valor de u.
O q e o c, nos seus valores duros, são substituídos por k.
O c só se emprega combinado com o h = ch.
O problema mais delicado surge-nos com a grafia dos sons ch e tch, em virtude de estes valores aparecerem frequentemente nas línguas bantas e serem representados por formas diversas, consoante os autores (c, cx, tx, ch, tch e ainda sh e tsh).


Nós adoptamos os grupos ch e tch, tendo o primeiro o som ch português da palavra ‘’chá’’ e o segundo o som da palavra inglesa ‘’match’’, que soa como tche ou tsh.
O f, quando precedido de p, de t ou de qualquer outra consoante, deve pronunciar-se muito fraca e suavemente.


O h é sempre aspirado, excepto quando combinado com c – ch.
O p e o h não se combinam; pronunciam-se separadamente, notando-se bem a aspiração do h.
O r é sempre línguo-palatal, muito suave, e pronuncia-se como em inglês, aproximadamente. Não tem o nosso r forte nem rr dobrados.


Encontram-se outras particularidades, destinadas a fixar a índole da pronúncia utchokwe, que facilmente se compreendem, como sejam: mb, mp, nd, ng, nz, dj.
Tanto o m como o n nasalam sempre com a consoante seguinte, mesmo que sejam precedidas de vogal.
Contracções e elisões
Em utchokwe, tal como em todas as línguas, também há contracções e elisões que convém notar, antes de entrar no estudo morfológico.


Assim, temos:
A+a contrai-se em a. Exemplo:
Ku-fwa atfu = kuf’átfu (morrem pessoas)
A+e contrai-se em e. Exemplo:
Na endele = n’endele (eu andei).
A+i contrai-se em e. Exemplo:
Na injile ou na injye = n’enjile (eu adoeci).
A+o contrai-se em o. Exemplo:
Kana ombo = kan’ombo (põe ovos)
A+u contrai-se em a. Exemplo:
Mawta = ma’ta (espingardas)
E+a contrai-se em a. Exemplo:
Membe a-ya = memb’á-ya? (de quem são os pombos)
E+e contrai-se em e. Exemplo:
Pembe enda = Pemb’enda (as cabras andam)
E+i contrai-se em i. Exemplo:
Pembe yono = pem’yono (a cabra está aqui)
I+i contrai-se em i. Exemplo:
Nzambi kuri yetwe = Nzambi kur’yetwe (Deus ‘está’ connosco)
Como se vê pelos exemplos atrás referidos, a vogal a cai antes de a, e, i e o; o e cai antes de a, e e i, enquanto o i apenas cai antes de i. Convém notar, porém, que nenhuma vogal se contrai com outra vogal inicial de um prefixo concordante ou complemento determinativo. Exemplo:
Yimbia ya etuwe = Yimbia y’etwe (a nossa panela).
O acento tónico recai sempre na penúltima sílaba, salvo raras excepções, visto a maioria das palavras serem graves.


Como adoptamos a grafia indicada no quadro fonético já citado, a acentuação tónica faz-se utilizando as semivogais w e y, como em inglês, evitando, assim, uma profusão de acentos.

Sílabas
Todas as palavras terminam em vogal e nunca em consoante.
Não há ditongos an, en, in, on, un. Por esta razão, tanto o m como o n nasalam sempre com a consoante que lhes segue e nunca com a vogal antecedente; e são puras quando seguidas de uma vogal.
Exemplo:
Ngaje = nga-je (fruto da palmeira ‘’den-den’’ e não négage , como muita gente diz).
Ngombe = ngo’mbe (boi)
Mpafu = mpa-fu (fruto semelhante a grandes azeitonas, produzido pela árvore resinosa mupafu).
Ndongo = ndo-ngo (agulha)
Nzambi = Nza-mbi (Deus supremo)
Mbunge = mbu-nge (coração)
Nzango = nza-ngo (amor)
Morfologia

Classe dos substantivos
Em utchokwe, tal como em todas as línguas bantas, dividem-se os seres em determinado número de classes, cujo conhecimento é absolutamente necessário, a fim de se poder estabelecer a perfeita concordância entre as diferentes palavras de qualquer oração.


Exceptuando as pessoas e alguns animais, que têm nomes especiais para cada sexo, todos os restantes são comuns de dois, ou epicenos, havendo, assim, cinco formas de géneros, a saber:
Dois géneros distintos (masculino e feminino), para as pessoas ou coisas personificadas; dois para as aves, um neutro para pessoas ou coisas personificadas, um neutro para coisas indeterminadas e, por fim, dois para designar, duma maneira geral, todos os seres animados, com excepção de coisas personificadas. Exemplo:
Lunga (o homem) Pfwo (a mulher)
Demba (o galo) Tchari (a galinha)
Kunji (o macho) Tchihwo (a fêmea)
Mutfu (a pessoa) Tchuma (a coisa)
Assim, quando se torna necessário determinar o sexo, sempre que a palavra o não indica por contexto ou por si mesma, forma-se o género juntando as palavras kunji ou tchihwo, regidas do respectivo genitivo para o masculino e feminino, tendo sempre em atenção as formas a empregar. Exemplo:

1ª forma – Só para pessoas ou coisas personificadas:
Mutfu wa lunga (pessoa homem ou pessoa macho, ‘’pessoa de macho’’)
Mutfu wa pfwo (pessoa mulher ou pessoa fêmea, ‘’pessoa de fêmea’’)
Mwana lunga (criança rapaz ou criança macho)
Mwana pfwo (criança rapariga ou criança fêmea)
Kanuke wa lunga (rapaz ‘’moço’’, macho ‘’rapaz de macho’’)
Kanuke wa pfwo (rapariga ‘’moça’’, fêmea ‘’rapariga de fêmea’’)
Kabindji wa lunga (escravo macho ‘’escravo de macho’’)
Kabindji wa pfwo (escravo fêmea ‘’escravo de fêmea’’)
Hamba rya lunga (ídolo macho ‘’ídolo de macho’’)
Hamba rya pfwo (ídolo fêmea ‘’ídolo de fêmea’’)

2ª forma – Como se vê, as palavras mutfu atfu (pessoa/s), podem ser designadas por género neutro, se queremos apenas indicar pessoas ou coisas personificadas, indefinidamente. Exemplo:
Mutfu kachi-ku (nem uma pessoa, ninguém está)
Atfu ku a-ri (há algumas pessoas, há gente)

3ª forma – Só para aves:
Kasumbi wa ndemba (galináceo macho ou galináceo de macho)
Ndemba kasumbi (macho galináceo)
Kasumbi wa tchari (galináceo fêmea) ou tchari tcha kasumbi (fêmea de galináceo)
Kajia wa ndemba (ave macho) ou ndemba kajia (macho ave)
Kajia wa tchari (ave fêmea) ou tchari tcha kajia (fêmea de ave)

4ª forma – Para qualquer ser animado, excepto para pessoas ou coisas personificadas:
Kachitu wa kunji (o animal macho ou animal de macho)
Kachitu wa tchihwo (o animal fêmea ou animal de fêmea)
Kunj’a panga ou panga wa kunji (ovelha fêmea)
Ngombe wa kunji ou kunj’a ngombe (boi macho ou boi de macho)
Tchihwo tcha ngombe ou ngombe wa tchihwo (boi fêmea ou boi de fêmea)

5ª forma – Para coisas indeterminadas:
Tchuma (coisa) Yuma (coisas)
Imate (coisa) Yumate (coisas)
Como se pode observar, só na 3ª e 4ª formas é que o género se pode empregar antes ou depois do nome, visto que, para pessoas ou coisas personificadas, se emprega sempre depois. Até nisto eles distinguem bem as pessoas de qualquer outro ser animado, porque como eles dizem, nenhum outro animal sabe pensar e raciocinar como o homem.

Exemplo:
Ndemba kasumbi ka-tchina bwalu kasumbi wa tchari ku a-ri kunu (o galo fugiu, mas a galinha está aqui; ficou)
Tchihwo tcha ngombe a-sema, hindu ngombe wa kunji kachiku sema (a vaca pariu mas, contudo, o boi não pode parir).

A ordem é arbitrária.
Com excepção dos substantivos, que têm uma forma para os dois números e que são ainda em número bastante elevado, todos os outros têm dois números (singular e plural), os quais se distinguem por prefixos diferentes, posto que, tal como em todas as outras línguas bantas, esta é também uma língua prefixativa ou aglutinada.
Para completar o que atrás ficou dito, expomos a seguir o quadro da transcrição fonética de dez vocábulos, nos quais são empregues os grafemas k, g, ch, tch, ny, e, w, yi, j, cujos sons poderiam suscitar alguma dúvida.
O referido quadro foi elaborado de acordo com o preceituado pela Association Phonétique International (API) e pela Nova Gramática Contemporânea (de Celso Cunha e Lindley Cintra).


In:Culturalunda-tchokwe